Diminuição de crédito, queda no consumo e pressão inflacionária remetem a um cenário econômico adverso para os próximos anos. Mas é justamente em momentos de crise que se encontram valiosas oportunidades para reduzir custos, readequar metas e, por que não, rever condutas. Uma delas refere-se à proteção do consumidor. Antes tida como custo para manter determinado nível de qualidade e atendimento, a proteção do consumidor deve ser vista hoje como uma oportunidade para prevenir conflitos de consumo, que geram altos custos econômicos e sociais.
Segundo o Relatório Justiça em Números, o Judiciário está cada vez mais congestionado. Em 2014, chegaram 28,8 milhões de novos processos, sendo que de cada 100 ações judiciais, 71 continuam tramitando sem decisão final. No mesmo ano, as despesas do Poder Judiciário somaram R$ 68,4 bilhões, o equivalente a 1,2% do nosso Produto Interno Bruto (PIB). Enquanto os direitos do consumidor figuram entre os três assuntos mais demandados na Justiça, os números dos Procons são igualmente estarrecedores. De acordo com o Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor, os Procons atenderam em 2015 cerca de 2,6 milhões de consumidores. Não fossem os elevados índices de acordo – de cada 10 consumidores, 8 tiveram seu problema solucionado pelo Procon –, muitos desses consumidores recorreriam ainda à Justiça.
Há um custo econômico e social que precisa e pode ser revisto. Ao mesmo tempo em que o consumidor busca soluções rápidas e efetivas para seus problemas, estudos apontam que o custo médio de um processo judicial para Estado – leia-se contribuinte – é de aproximadamente R$ 2.300. Para as empresas o custo é ainda maior.
A Secretaria Nacional do Consumidor, em conjunto com os Procons, lançou o consumidor.gov.br, uma plataforma para solução de conflitos por meio da internet, que já conta com a adesão de mais de trezentas empresas. Além da solução em até dez dias, a ferramenta fornece um diagnóstico apurado dos principais problemas enfrentados pelos consumidores, do desempenho e conduta das empresas, além de incentivar a competitividade pela melhoria da qualidade e do atendimento ao consumidor. Recentemente, a Secretaria lançou outro incentivo ao mercado: empresas que tenham programas de prevenção de conflitos de consumo e estruturas dedicadas ao tratamento e resolução de conflitos podem ter suas multas diminuídas nos processos administrativos sancionatórios.
Cabe agora ao mercado investir esforços na prevenção e redução dos conflitos de consumo. Um dos caminhos é o desenvolvimento de programas de compliance, que busquem a adequação do produto ou serviço às normas de proteção e defesa do consumidor, que aprimorem condutas, que ampliem a efetividade e a qualidade dos canais de atendimento e que fortaleçam o diálogo com os órgãos de defesa do consumidor, para a solução rápida e eficiente dos problemas. O conflito está cada vez mais caro. E envolve não apenas os custos de processos, multas e sanções, mas também danos à imagem e à reputação das empresas.
Não basta apenas ouvir. É preciso ouvir, compreender e dialogar com os consumidores que vão exigir cada vez mais a escuta atenta das empresas. Após 25 anos do Código de Defesa do Consumidor, temos hoje em nosso País um ambiente propício ao diálogo maduro, transparente e necessário entre os diversos atores envolvidos – consumidor, Estado e mercado. A crise nos trouxe a oportunidade de rever e reduzir os altos custos do conflito. Como diz o provérbio chinês, nós não podemos mudar o vento, mas podemos ajustar as velas do barco para chegar aonde quereremos.
Amaury Oliva é especialista em direitos do Consumidor e sócio de PGLaw. Foi Diretor do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor, da Secretaria Nacional do Consumidor do Ministério da Justiça.